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Espiritualidade a partir de uma visão cristã e de uma visão plural

Ao longo da história, a Humanidade e a própria Igreja Católica foram fortemente influenciadas por uma visão dualista do ser humano, difundida a partir da filosofia grega, particularmente de Platão. Segundo essa filosofia, o que propriamente identifica o homem é o espírito (a dimensão espiritual), cujo desafio é desenvolver-se apesar da adversidade da matéria, o corpo. Urge livrar-se deste, que é considerado o cárcere da alma.

Há, portanto, uma separação e verdadeira oposição entre espírito e matéria, material e espiritual. Em boa medida, isso rendeu, por muito tempo, o desprezo pelo corpo como um fator fundamental no cultivo da espiritualidade.


Mas, para agora definirmos a espiritualidade a partir de uma visão cristã, precisamos, primeiramente, recorrer à Sagrada Escritura. Aí encontraremos uma visão unitária do homem, e não dualista. É o ser humano como um todo que nasce, se desenvolve, amadurece e morre. É o homem todo que morre, e depois é ressuscitado pelo amor misericordioso de Deus.

Essa compreensão fica especialmente clara em São Paulo. Em 1Ts 5,23b, ele escreve: “Que o espírito, alma e corpo de vocês sejam conservados de modo irrepreensível para a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo”. Sem fazer uma oposição entre o “espírito” e o “corpo”, o “espiritual” e o “corporal ou material”, distingue, contudo, entre homem “espiritual” e homem “carnal”. O homem integral, em sua dimensão espiritual e corpórea, é “homem espiritual” ou “homem carnal” (1Cor 3,1-3).

O homem “carnal” é o que ainda não se abriu para Deus e, por isso, se deixa levar pelos impulsos carnais, como ganância, inveja, ciúme, rixas, divisões, etc. É um comportamento meramente humano, fechado para a presença de Deus (Cf. 1Cor 3,3).

Enquanto isso, o sentido da vida cristã é ser “espiritual”; deixar-se conduzir pelo Espírito do Ressuscitado. Este é o sentido da espiritualidade na visão cristã: levar um estilo de vida que se deixa ensinar e conduzir pelo Espírito (Cf.1Cor 2,12-13). Ou, como se dizia no séc. V: “Espiritualidade como vida nova em Cristo, seguindo o seu Espírito”. Aí entram todos os momentos da vida: oração, meditação, estudo, trabalho manual, vida familiar, social, política, econômica, etc. Enfim, em tudo há um jeito ou estilo cristão de viver, se realmente somos “homens espirituais”.

Temos, assim, uma visão cristã da espiritualidade. Mas, no mundo de hoje, cresce cada vez mais uma visão plural da espiritualidade, que acaba influindo no cristianismo. Essa visão plural está, primeiramente entre o mundo agnóstico e ateu. Trata-se de novas espiritualidades (ou religiosidades), sem religião e sem Deus. Mas, em princípio é um modo de pensar, sentir e agir aberto, com ou sem referência a um Absoluto.

Dentro do Cristianismo, falar de uma visão plural da espiritualidade, nos lembra que há contextos históricos diferenciados, donde também se justificam correntes espirituais distintas ou diferentes estados de vida. Enfim, não obstante a centralidade cristocêntrica, fica melhor falar em “espiritualidades cristãs” do que em “espiritualidade cristã”.

É nesse sentido que se fala em espiritualidade patrística, espiritualidade monacal, etc. Sempre com o desafio de viver o Evangelho em diferentes épocas e contextos. De modo semelhante, ainda hoje podemos distinguir entre as espiritualidades das diversas congregações e ordens religiosas; espiritualidade presbiteral; espiritualidade dos cristãos leigos e outros (as). Todas bebendo da mesma fonte, encontrada pela samaritana ao buscar água no poço de Jacó (Jo 4,5-42).


Autor: Pe. Aloísio Ruedell - Coordenador Diocesano de Pastoral

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