Amazônia: “universo multicultural”
Pode existir quem ainda pense a Amazônia como um vasto deserto verde, onde haja nada e nem ninguém. Papa Francisco, no capítulo sonho cultural, de sua Carta, anota: “Na Amazônia, vivem muitos povos e nacionalidades”. Sinal de que ali estão presentes mundos culturais com grande diversidade. E lembra que, ainda, aí vivem vários “povos indígenas em isolamento voluntário”. Faz, também, alertas: “a sua situação é fragilíssima; e muitos sentem que são os últimos depositários dum tesouro destinado a desaparecer, como se lhes fosse permitido sobreviver apenas sem perturbar, enquanto avança a colonização pós-moderna”.
Após apresentar essas observações, resultantes de sua atenção aos debates desenvolvidos em todo processo do Sínodo sobre Amazônia, o Papa lança um convite muito insistente: “Temos que evitar de os considerar como ‘selvagens não-civilizados’; simplesmente criaram culturas diferentes e outras formas de civilização, que antigamente registaram um nível notável de desenvolvimento”. Sugere, pois, diálogo responsável sobre este tema.
Constatações
O Papa indica aspectos para ajudar a refletir sobre esta realidade. “Os grupos humanos, seus estilos de vida e cosmovisões são tão variados como o território, pois tiveram que se adaptar à geografia e aos seus recursos”. Tal situação é notada nos modos distintos de ser e de viver. “Não são iguais as aldeias de pescadores às de caçadores, nem as aldeias de agricultores do interior às dos cultivadores de terras sujeitas a inundações. Além disso, na Amazônia, encontram-se milhares de comunidades de indígenas, afrodescendentes, ribeirinhos e habitantes das cidades que, por sua vez, são muito diferentes entre si e abrigam uma grande diversidade humana”. Eis elementos de riqueza cultural a preservar.
Essa rica sabedoria resulta de longa tradição a estimar. “Durante séculos, os povos amazônicos transmitiram a sua sabedoria cultural, oralmente, através de mitos, lendas, narrações”. Do seu jeito de ser faz parte a prática de contar histórias. Tais experiências existenciais ajudam a manter “viva uma comunidade que, sem o cordão umbilical destas histórias, a distância e a falta de comunicação teriam fragmentado e dissolvido”. Os aspectos da cultura popular são como esteios a manter firme a casa da vida do povo.
Responsabilidades
Os alertas para respeitar as tradições culturais não impedem o diálogo entre participantes de diversas culturas. Por isso, o Papa anota: “é a partir das nossas raízes que nos sentamos à mesa comum, lugar de diálogo e de esperanças compartilhadas. Deste modo a diferença, que pode ser uma bandeira ou uma fronteira, transforma-se numa ponte. A identidade e o diálogo não são inimigos”. Ou seja, afirmar o próprio modo de ser não impede de reconhecer o valor de outros jeitos de ser.
E o Papa ainda lembra: “a própria identidade cultural aprofunda-se e enriquece-se no diálogo com os que são diferentes, e o modo autêntico de a conservar não é um isolamento que empobrece”. Seu propósito, ao refletir sobre essas questões, é de criar práticas de diálogos criativos, críticos e propositivos. Ele visualiza essa perspectiva como tarefa de todos. “Por isso, cuidar dos valores culturais dos grupos indígenas deveria ser interesse de todos, porque a sua riqueza é também a nossa. Se não progredirmos nesta direção de corresponsabilidade pela diversidade que embeleza a nossa humanidade, não se pode pretender que os grupos do interior da floresta se abram ingenuamente à ‘civilização’”. É propósito desafiador.
Autor: Pe. Carlos José Griebeler - Pároco de Santo Cristo